BRAVIO - Associação Brasiliense de Violão

Notícias sobre o violão de concerto em Brasília

O Barroco revive nas mãos do Canadense David Jacques

O segundo encontro preparatório para as atividades da BRAVIO (Associação Brasiliense de Violão) teve como convidado especial David Jacques. Canadense de Montreal e professor titular da Universidade de Quebec, o músico estava em turnê na América do Sul, se apresentando no Chile, no Brasil e na Argentina. Brasília foi a primeira cidade brasileira na sua viagem, e David ficou encantado pela cidade, especialmente pelo verde abundante. E como ele adorou as frutas brasileiras, especialmente caju e goiaba!

Nessa turnê, ele apresentou obras de Johann Sebastian Bach, Francesco Corbetta e Gaspar Sanz numa guitarra barroca, ou seja, numa réplica de um violão do tempo desses compositores. Apesar de seu trabalho ser bem amplo, incluindo jazz e música contemporânea, na masterclass que foi realizada à tarde a maioria dos alunos preferiu apresentar obras do barroco. Alexandre Aguiar (primeira foto) foi uma das exceções, e apresentou Schotisch-Choro, de Heitor Villa-Lobos.

David fez ótimos comentários especialmente sobre fraseado, e como manter o interesse do público ao tocar trechos que se repetem várias vezes. Foi nitida a diferença de interpretação de Alexandre após os comentários de David e espero que tenham sido úteis para ele. Em seguida, Hugo Leonardo apresentou Canários e o Minueto em sol maior do caderno de Anna Magdalena Bach. David contextualizou a peça de Gaspar Sanz no seu momento histórico, falou de como era interpretada aquela dança das Ilhas Canárias em seu tempo, e especialmente da riqueza rítmica da obra. Hugo fará a prova específica para o curso de música da UnB e deverá tocar essa peça na prova. Desejamos sucesso e que a aula o tenha ajudado na realização de seus sonhos.

Luiz Renato, colega de Alexandre Aguiar no curso de violão do Departamento de Música da UnB e um dos sócios fundadores da BRAVIO, subiu ao palco para apresentar o Prelúdio da III Suite para Violoncelo de J.S. Bach no arranjo de Eustáquio Grilo. Sua interpretação foi muito segura, mas David apontou muitas coisas que auxiliaram para melhorar ainda mais seu desempenho. Muitas dicas de fraseado, de relaxamento x tensão e sobre o caráter de cada trecho da obra contribuíram para uma interpretação mais sólida de Luiz. Ao longo da aula a platéia também se manifestou fazendo perguntas interessantes, participando ativamente, aprendendo o máximo possível e enriquecendo o evento.

Pedro Rogério foi o último inscrito na masterclass a se apresentar, tocando o Prelúdio da I Cello Suíte de Bach no arranjo de John W. Duarte. David ajudou o jovem violonista orientando-o sobre a produção do seu som, da qualidade do timbre que ele estava tirando do seu instrumento, e fez vários comentários sobre fraseado, agógica e caráter parecidos com o que ele havia falado ao Luiz Renato. Foi interessante ele lembrar que a origem do Prelúdio nas Suítes Barrocas era uma peça para testar a acústica, aquecer o instrumento e tinha um forte caráter improvisatório. E, apesar de em Bach as notas estarem todas escritas, deve-se buscar uma interpretação que mostre o máximo possível que aquilo é um improviso, apesar de escrito.

Para sorte de Roberto, que não havia se inscrito previamente, uma das pessoas que iriam tocar nesse masterclass não estava presente e foi possível ele tocar para o convidado desse mês. Roberto apresentou o Prelúdio 3 de Heitor Villa-Lobos e David fez boas observações sobre o fraseado, sobre o cantabile das longas melodias que estão presentes nessa obra, e sobre o peso e a importância de cada nota, especialmente sobre os semitons.

Ao final, ele comentou um pouco sobre seu instrumento, os participantes puderam ver de perto uma réplica de uma guitarra barroca feita por Stradivarius, mas deixou todos com água na boca, e disse que só tocaria o instrumento no recital à noite.

O recital foi uma noite inesquecível. O que mais causou admiração entre os presentes foi a habilidade de David Jacques, que mesmo tocando um instrumento tão delicado e com poucos recursos de contraste tímbrico e dinâmico, foi capaz de manter a atenção da platéia mesmo interpretando obras muito longas. Poucos músicos têm essa qualidade, que exige um bom domínio técnico mas, acima de tudo, musicalidade e maturidade.

David iniciou com Prelúdio e Allemande de Francesco Corbetta, compositor da corte de Luis XIV, o rei-sol. Em seguida, um grande bloco de obras de Bach: Partita BWV 1001 (II Partita para violino), Adagio BWV 1001 (I Sonata para violino) e Suíte BWV 1007 (I Suíte para Cello). As interpretações foram maravilhosas, e era extasiante como ele lidava com o fraseado, a agógica, formas diferentes de tocar trechos repetidos (sem necessariamente abusar dos ornamentos), o valor de cada voz, cada nota, cada acorde... Foi essa habilidade que tornou um recital com peças tão longas tão interessante.

Para terminar com um ar mais alegre, Canários, de Gaspar Sanz. A empolgação, a alegria, a vivacidade e o ritmo que marcaram a interpretação do convidado foram tão marcantes que ao final do recital ouvíamos pessoas cantarolando ou assoviando trechos da obra. Foi uma ótima peça para encerrar de forma tão bela esse recital. E, de bis, outra peça de Sanz: Sarabanda sobre uma Ária Espanhola.

A platéia, que contava com a ilustre presença do sr. Guillermo Ryshchynski, Embaixador do Canadá no Brasil e sua gentil esposa, a Embaixatriz Jeannette Ryshchynski, ficou muito satisfeita com o recital ao final. Muitos pediram autógrafos ao artista, queriam tirar fotos com ele, e foi muito bom ver que algumas famílias ficaram muito felizes com o evento, apesar de terem sido obrigados a enfrentar uma chuva muito forte. David ficou surpreso com a alegria do público, e de certa forma até preocupado: só nessa noite quase todos os CDs que ele trouxe foram vendidos, restando apenas quatro exemplares - e havia ainda mais cinco recitais na turnê. Alguns comentaram que seria ótimo vê-lo num dos Festivais de Verão da Escola de Música, especialmente tocando num ambiente com maior reverberação, como a Catedral de Brasília. Espero que a direção da EMB convide David Jacques, seria uma ótima presença para engrandecer essa grande festa da música que acontece na capital federal nos meses de janeiro e fevereito.

Fotos: Wagner Rodrigues 3351-7528 / 9101-7528